Monday, July 04, 2005

Morrer é uma questão de método

Poucas coisas na vida despertam tanto a curiosidade do homem quanto a morte, mas a verdade é que não se sabe muito sobre ela – exceto que ela gosta de se vestir de preto e que volta e meia pode ser vista entoando Another One Bites the Dust em bares de karaokê vitorianos (embora existam muitos poucos desses hoje em dia). Há, afinal, vida após a morte? E quanto a nossa alma, será ela imortal ou apenas megalomaníaca?

Existem várias teorias sobre a morte, mas absolutamente nenhuma delas explica a aplicação da Lei da Relatividade na gastronomia étnica de nosso país (talvez porque, nas palavras de um ilustre expoente da sociedade científica que não quis se identificar, "nós possamos ter-nos desviado da nossa linha de pesquisa em algum momento"). Como muitas pessoas já desconfiavam, bater as botas é, no fundo, o menor dos nossos problemas (contanto, naturalmente, que você se sinta bem com a cor do seu cadarço). O que acontece depois é, isso sim, o verdadeiro mistério. Para onde vamos, quanto tempo demora para chegar lá e que tipo de roupa devemos levar são perguntas que já passaram pela cabeça de todo mundo pelo menos uma vez na vida, seja ele o moribundo tísico, o atleta saudável ou a sua tia distante que lhe manda uma boneca todo Natal (embora você se chame Ernesto e tenha 26 anos há até bastante tempo).

Quem, afinal, paga a conta de luz para que você possa ter todo aquele espetáculo pirotécnico no fim do túnel que sempre lhe prometeram? Certamente não os seus parentes, que ainda estarão se desdobrando - literalmente, se você pertencer a uma família de contorcionistas - para pagar todo o ônus funerário de sua morte enquanto você toma banana daiquiris no céu (ou no inferno, caso você seja ateu, advogado ou simplesmente um pé-no-saco) e discute a arte da jardinagem filipina com Alfredo, um carteiro que faleceu no ano anterior graças a um sinistro ataque de fúria por parte de anões belgas que andavam se sentindo marginalizados pela sociedade capitalista e opressora. Quanto ao seu plano de saúde, como pedir para que ele pague por sua luz no fim do túnel se ele sequer cobria suas despesas dentárias quando você estava vivo? Deus, a opção que para muitos poderia ser apontada como a mais plausível e justa (talvez porque Ele seja a única entidade sobrenatural que tenha American Express, embora haja os que digam que é puro exibicionismo de Sua parte), tampouco: com tantas guerras, enchentes e penteados dos anos 80 mundo afora para serem enfrentados, todo o trabalho burocrático não resistirá muito antes de ser relegado para as instâncias inferiores.

Mas quem são essas instâncias inferiores, uma pessoa razoável poderia questionar (ou simplesmente pular o assunto e, no lugar, começar a fazer um curso de estenografia por correspondência, uma vez que ela é uma pessoa razoável esclarecida e faz o que bem entender). Para a Grécia Antiga, elas se chamavam Cloto, Laquesis e Atropos e eram conhecidas como as Parcas, figuras mitológicas que controlavam os fios da vida e decidiam quem morria ou não. A Grécia Moderna já não pensa mais assim, embora continue faturando horrores no mercado têxtil temático.

Já grande parte do Ocidente gosta de acreditar que os anjos são os funcionários públicos do Paraíso. Daí inclusive teria originado a idéia de anjo-da-guarda: enquanto Deus se ocuparia com tarefas de escala mais global – como eras glaciais e chuvas que duravam 40 dias e 40 noites (o que era uma grande sacanagem com todos aqueles que não detinham o monopólio das construtoras de arcas) -, os anjos estariam empenhados numa missão mais individual e menos sensacionalista. Todavia, a imagem pulcra e nobre que temos do exército do Senhor é altamente questionada pelos Letrismo, uma escola histórica pouco afamada que crê que a Bíblia nada mais foi do que uma sopa de letrinhas que Deus acidentalmente deixou derramar durante uma briga com Zeus a respeito de marcas e patentes. Para os letristas, apesar da versão oficial nos contar que Deus teria descansado no sétimo dia, a verdade seria que, irritados com a fama de que passavam o dia tocando harpas que seria espalhada num futuro longínquo pelo homem – a mais recente e mimada criação divina -, os anjos teriam feito a primeira greve da história e se recusado a completar tarefas como a paz mundial e o Grand Canyon. (Rezam as lendas que, como punição, a ira divina teria lhes tirado o sexo e ainda ganho uma fortuna ao patentear os bonecos Ken.)
A morte varia de cultura para cultura, de época para época e de pessoa para pessoa, não obstante seus contínuos esforços para entrar na era da globalização. Não podemos, por exemplo, tentar entender como um aristocrata via a morte em plena Revolução Francesa, embora alguns relatos de sobreviventes nos digam que ela parecia um pouco afiada demais para seus pescoços. Até podemos andar pelo vale da sombra da morte sem temermos mal algum, mas nossos passos nunca serão iguais aos de outra pessoa. Para uns dolorosa, para outros, uma bazófia; o começo para um pai e o fim para um filho; uma redenção ou um pesadelo: a morte é uma essência que nem a pena dos mais afiados escritores conseguiram transpor integralmente para o papel (embora um mico adestrado tenha chegado muito perto uma vez, mas isso não passou de uma assombrosa coincidência).

28 comments:

Anonymous said...

lindo, maravilhoso, fantastico, estupendo, sooorm, espetáculo!!!!! (na verdade eu não li, to morrendo de preguiça!!)

Anonymous said...

Eu sempre fui facinado pela morte. Ficava desenhando atrás das provas no 1º e 2º grau. E se o professor fosse judeu, acrescentava uma suástica... sempre me ajudou a não receber esporros por não fazer o dever de casa, ou pro professor considerar que meu "d" era igual ao "c", e que portanto, minhas multiplas escolhas estavam sempre certas, e ele era um verme imundo que não conseguia enxergar direito!!! Viv's, eu não me afastei. pra falar a verdade deve fazer meeeeses que não recuso um convite seu pra sair. Talvez seus convites é que tenham diminuído! hehehehehe, no meu ponto de vista, vc que se afastou! Bjssssssss

Anonymous said...

Absolutamente fantástico. Preciso dizer mais?

Anonymous said...

Tá bom, eu detesto ser pela-saco, mais vc tá se superando a cada texto... Estou me sentindo humilhada. Bjs!

Anonymous said...

e ai, anna vii!! Caramba, lendo seus textos é que eu me lembro que vc é foda... hauhuahua, saudades de vc e suas intelectualidades! Beijinhos

Anonymous said...

lendo esse texto, uma famosa pergunta surgiu em minha mente - meio desconexada com o qual, mas tudo bem: pq, enfim, o ceu eh azul?!?! sim, sim, eu frequento seu blog anna virginia blosaud balboasudhasud rtnsmnfpsadf ancora da luz!!! =D haha, sem mais bobeiras.. adorei o texto! embora ache q tenha comentarios sordidos acima do permitido, vc eh foda! concordo com a gabi.. tenho saudades da suas intelectualóides.. bjus anna!

Anonymous said...

eita, na sabia q isso aqui na aceitava espaços e enters.. Mal pela bagunça! bjus

Anonymous said...

Muito bem, já que todo mundo resolveu dar as caras(no sentido não literal) eu fiquei tentada a comentar.Não vou dizer que seu texto é fantástico, nem que você é incrível, muito menos que sinto saudades. Quero só registrar que, na verdade, o adjetivo que lhe coube durante muitos anos foi o de pseudo intelectual amante das boas músicas. Não havia esses neologismos sórdidos. Ouviu rafael Uchôa??????? beijos sem recentimentos

Anonymous said...

vou escrever aqui só pra deixar registrado que eu li o texto, assim como todos os outros, e que tá ótimo. (se tivesse ruim tb diria q está ótimo, mas está bom de verdade). Só não entendi seu desejo de se chamar Zaphod Beeblebrox no além!!!!!!!! (vários pontos de exclamação em sua homenagem!!!!!!!!: papo reto - tb em sua homenagem). Anna Virginia Martins Sinclair Balloussier Ancora da Luz não é karma suficiente pra vc??????? hehehehe bj, vivi's.

Anonymous said...

a minha palavra de confirmação foi... than, than, than: animei!

Anonymous said...

Eu sei q esse post é extraordinário, e etc, etc, etc, mas... ATUALIZA! ATUALIZA! Queremos mais!

Anonymous said...

Madame Virgínia, a vidente global...

Anonymous said...

Inspirador pra um escrever um romance cômico patético sobre um guia de viagens para o além. Só precisa achar um nome mais criativo que Zaphod Beeblebrox pra personagem principal. Que tal Marvin?

Anonymous said...

Espumante.

Anonymous said...

concordo com a aninha, esse blog tá mt devagar. Assim eu não tenho com q driblar meu tédio. :p

Anonymous said...

Meu Deus.... cada um escreve cada coisa (e as mesmas coisas) q nem sei o q escrever! Bjs Anna Vivi!!!

Anonymous said...

É..... eu sei, eu d novo! Anninha querida do meu coração, vc tem alguma idéia pq meu pai me chamava de "Gorbachova" qndo pequena????? Eu li o texto do dia 22/10 e me lembrei disso....... será

Anonymous said...

É..... eu sei, eu d novo! Anninha querida do meu coração, vc tem alguma idéia pq meu pai me chamava de "Gorbachova" qndo pequena????? Eu li o texto do dia 22/10 e me lembrei disso....... será q é pq eu era rechonchudinha???? Bjokas na Vivi!

Anonymous said...

Nada será páreo para o MEU Blog: http://mundodoespetaculo.zip.net

Anonymous said...

Nas vc esqueceu que os MENTIROSOS tambem vao para o inferno tah?

Bruno said...

DE ONDE VIERAM ESSES 20 COMENTÁRIOS?! Me assustei. Achei que todo mundo tinha desistido de estudar.

Mimi Merlot said...

Para prevenir qualquer graçinha de Virginia-está-se-auto-promovendo-oh-my!: estou fazendo corte e colagem no meu antigo blog pq não quero perder nem os textos, nem os comments (ou a popularidade merecida, aham).

Anonymous said...

Não sei, mas "Quem tem medo de virginia luz" mais parece um título para livro do Sidney Sheldom...

Anonymous said...

Bem escrito, cheio de ironias, mas o excesso leva ao cansaço, a repetição ao tédio, e um texto que se lido em partes é engraçado e descontraído, no todo acaba se mostrando um emaranhado enfadonho de parágrafos que se estruturam de forma, se não idêntica, bastante semelhantes... Mas enfim, talvez minha impressão se deva ao fato de que esse gênero de texto coluna-de-jornal-redação-de-vestibular, que vive dessa formulazinha pronta que o PH ensina tão bem, e que tive que repetir trezentas vezes variando de tema para tema mas no fundo sabendo qui c'est tout la même chose, hoje me dê náuseas e tenha que fechar os olhos e respirar fundo para conseguir continuar a ler, e que se não fosse pela enxurrada de ironias, que acabaram se desgastando pelo excesso, talvez não conseguisse chegar até o fim.
Bem, ainda há aqui uma ponta de esperança. Transpondo as barreiras das dissertações de colégio e sabendo moderar a quantidade de ironias(até mesmo para valorizá-las), um dia ,quem sabe, possa ser digna de algum reconhecimento da minha parte. Por enquanto, só posso parabeniza-la pelo seu esforço e por fim lhe deixar um consolo: que não é preciso ser genial para conseguir admiradores, vide os comentários que precedem este. Então, não se preocupe, haverá a seguir uma manada de fãs defendendo o seu texto e rebatendo minhas criticas, bajuladores é claro, mas não há nada melhor do que isso quando o que se precisa é de uma massagem no ego.

Anonymous said...

Hahahhahahhahahhahahaha....³

Mimi Merlot said...

Não ri, ele está difamando a minha reputação com críticas construtivas (e que, portanto, deverão ser ignoradas)! Agora, a referência ao pê-agá foi over mesmo... Massagem no ego, só se for massagem cardíaca, yes, sir!

Anonymous said...

Tsc, tsc, tsc. Me da um A! e dá um N!...

Aline Brandão said...

De onde viemos? Para onde vamos? Lá tem Internet? É de banda larga?